Paula Brant

Por que precisamos de lideranças com competência política?

Na atualidade, temos nos deparado, cada vez mais, com contextos que revelam níveis altos de incerteza. Nesse cenário, a liderança ganha outros contornos e à medida que o nível de complexidade aumenta, sua atuação amplia para além da relação líder-liderado e passa a envolver também pares, superiores, parceiros estratégicos, clientes e a sociedade como um todo. Nesse sentido, a legitimidade da liderança se suporta na agregação de valor para todos os stakeholders.  O líder passa a atuar em diferentes “arenas políticas”, o que demanda o desenvolvimento e a mobilização da sua competência política. Essa é uma competência relacionada a capacidade humana de interação e efetividade social no trabalho em prol de um objetivo e independente do poder formal.

A pandemia mostrou o crescente grau de interdependência em escala mundial. Precisamos de líderes que saibam se relacionar bem com seus colaboradores, clientes, parceiros, fornecedores e até mesmo outros países. Não é mais possível prever exatamente quando uma crise irá acontecer e ter boas relações pode ser fundamental para garantir o acesso a recursos e outras soluções que contribuam para lidar com os problemas não previstos.

Infelizmente, vivemos em uma sociedade que apresenta altos índices de polarização com lideranças que reforçam o “nós contra eles”, ao invés de conciliarem as diferenças, utilizarem a sensatez na sua tomada de decisão e avaliarem as questões de maneira contextual, ao invés de absoluta. A sensação é que as lideranças dos polos por terem grande convicção de suas crenças, tem sua voz ativa e acabam fomentando a discórdia. Precisamos de líderes que desenvolvam sua competência política de maneira que busquem o bom senso e levantem sua voz em busca de uma sociedade mais unida e colaborativa.

A expressão “competência política” é proveniente da junção de dois termos em inglês Political Will (vontade política) e Political Skill (habilidade política). Nas últimas décadas, surgiram pesquisas que relacionam positivamente essa competência a efetividade da liderança, facilitação da performance dos liderados, suporte na mobilização de coalizões, gestão do compartilhamento de significado entre outros.

A política lida com a dimensão informal das organizações e a gestão das interações sociais no ambiente de trabalho. A noção de política nasceu da ideia de que, quando os interesses são divergentes e preciso que os indivíduos busquem formas de reconciliarem as suas diferenças por meio da consulta e da negociação, evitando assim formas e regras totalitárias. O sistema de influência política é descrito como aquele que obriga a “pessoa responsável” a lutar pelo que acredita ser certo, encoraja uma variedade de “vozes” que precisam ser ouvidas e cada “voz” precisa tirar suas próprias conclusões sobre as necessidades da empresa como um todo.

A maioria das pessoas vê a política como exclusivamente negativa, no entanto, ao considerar a neutralidade do termo é possível ampliar o seu entendimento e incluir a sua perspectiva positiva. No lado extremo de um continuum temos o “político” que age em benefício próprio, em uma área central aquele que fica “em cima do muro” para manter contatos com grupos de interesses distintos do seu próprio. E no lado extremo oposto, encontramos lideranças que agem com benevolência, se posicionam diante de situações de injustiça, sabem lidar e respeitar as opiniões diferentes da sua e buscam soluções harmónicas sem o uso da violência. Os grandes exemplos de líderes com competência política da história são Gandhi, Mandela e Martin Luther King.

No Brasil, uma representante de liderança com competência política na atualidade, é sem dúvida, a Luiza Helena Trajano que durante a pandemia tem demonstrado sua competência em vários desafios que surgiram. Ela tem coragem e se expõe. Ao aderir ao “não demita” e ao criar a comunidade “Unidos pela Vacina” ela demonstrou a sua vontade de fazer acontecer, assumindo os riscos e incertezas, ao invés de omitir-se. Ela admitiu que não sabe se será possível chegar à meta de todos vacinados até setembro como proposto inicialmente, mas o que a levou a agir foi sua consciência de que algo precisava ser feito pelo Brasil e sua população. Ela acredita que a vacinação é a única solução. Ela sabe ainda que pode ser que ao chegar setembro, a meta necessite ser revista, alguns erros precisarão ser avaliados e admitidos, mas ela tem capacidade de adaptação e é guiada por seu foco no bem comum. Ela também é competente em se posicionar em situações potencialmente conflituosas e usa sua autenticidade para deixar claro para todos a sua boa intenção. Ao implementar o programa de trainee exclusivo para profissionais negros, ela assumiu o fato de que o número de profissionais negros em cargos de liderança é muito baixo ou inexistente, na maioria das empresas, e que essa realidade precisa ser mudada. Ela assumiu a responsabilidade de buscar essa mudança dentro da Magazine Luiza e com isso inspirar outras empresas a fazerem o mesmo. Para ela, as cotas fazem parte de um processo transitório para corrigir desigualdades que de outra forma se perpetuarão. A Luiza Helena Trajano se declara uma política nata já que desde pequena se incomodava com as desigualdades, questionava e tentava fazer algo a respeito. Ela demostra a sua competência política ao dar voz as pessoas, criar processos participativos e incentivar a conciliação e não fomentar a polarização. O grupo “mulheres do Brasil” uma comunidade suprapartidária presidida por ela que busca igualdade de gênero e raça, começa a ter a participação de integrantes do sexo masculino que se unem a causa e se orgulham de participar do grupo “mulheres do Brasil”.

O desenvolvimento da competência política poder ser um grande diferencial no contexto atual para que os líderes atuem em prol do que acreditam ser o certo, mobilizando as pessoas, estabelecendo conexões construtivas e criando um ambiente mais participativo, humano e sustentável.